segunda-feira, 16 de setembro de 2013

TEMPO PERDIDO

  
Todos estavam lá. Felizes, conversavam alto, riam e se divertiam muito. Contando histórias, relembrando os bons tempos de crianças, com suas brincadeiras e travessuras.
Ao longe, o pai os observava em silêncio. Satisfeito, pois, após muito tempo, a casa enorme, estava cheia novamente.
Era natal.
À distância, via os sorrisos dos filhos, e sentia uma tremenda felicidade, nesse momento, tentou se lembrar dos momentos de intimidade que tivera com eles, então, percebeu que não havia tido tais momentos.
Percebeu que, apesar de serem seus filhos e de ter vivido a vida toda com eles, ele não os conhecia. Não sabia nada da intimidade deles.
Não conhecia seus sonhos. Seus desejos. Suas realizações. Suas decepções. Não sabia de nada sobre a vida deles. Simplesmente, de nada.
Então, foi tomado por um sentimento nostálgico. De repente a nostalgia tomou conta de si e passou a lembrar dos momentos em que presenciou sua esposa e seus filhos conversarem, longamente, por tardes e às vezes, quase dias inteiros. Lembrou-se também das conversas rápidas e diretas que tivera com eles, tudo se resumindo a um; “Tudo bem!”
Viveu correndo contra o relógio por toda vida. Sempre dedicado ao trabalho, vivia viajando e em reuniões intermináveis. Saía de manhã e voltava à noite, muitas vezes, tarde da noite. Aos sábados, domingos e feriados, vivia com um telefone na mão conversando com seus subordinados e realizando relatórios e mais relatórios.
Fez tudo o que se esperava de um bom pai de família. Deu conforto e estudo a sua esposa e filhos. No entanto, naquele momento, viu que se esquecera dos relacionamentos familiares. Naquele momento, percebeu que seu relacionamento com os filhos sempre foi frio, sem vida, sem qualquer familiaridade.
Ao ver sua família reunida sentiu o peso de suas atitudes involuntárias, mas, atitudes que de certa forma, prejudicaram muito a ele e aos seus filhos.
Olhando seus filhos, tomou uma decisão, sabia que era tardia, mas naquele momento não se importava. Tinha que mudar. Tinha que mudar sua atitude perante os filhos, perante a sua família. Ao que restou da sua família. Já havia perdido a esposa,  não podia perder os filhos.Isso seria demais para ele.
Sua mulher falecera há alguns meses. Desde então se sentia sozinho Triste. Deprimido. O problema não era só a solidão que sentia. O problema era a culpa que carregava no seu coração. Viveram vinte anos juntos e ele falhou. Falhou como pai, falhou como marido. Nunca deu a sua família o valor que ela devia. Sempre os deixou para o segundo plano. Sua vida se resumira, há trabalho, trabalho, trabalho e nada mais.
O sentimento de culpa não o abandonava, um segundo sequer. Lembrava-se a todo o momento dos olhos tristes da esposa. Principalmente, quando ela adoeceu. E punha-se a imaginar toda a solidão que ela sentira com as suas constantes ausências. Mesmo, quando ela mais sofria. Mesmo quando ela mais precisava.
 Por isso, a partir daquele momento, fez uma promessa a si mesmo: Não haveria de perder mais nada que a vida pudesse lhe ofertar.
“Onde já se viu um pai não conhecer seus próprios filhos” – pensou.
Não tinha dúvidas quanto ao amor que seus filhos nutriam por ele, sabia que o amavam incondicionalmente, mesmo com seus defeitos, que não eram poucos, e suas limitações, afinal, ele era o pai, o pai que os criara, que lhes dera abrigo e proteção, que lhes dera um bom futuro. O pai que os amava. Amava do seu jeito, mas os amava. Isso era uma certeza.
Nesse momento de reflexão sentiu que teria que mudar. Para isso precisava de coragem.
Vendo os filhos ao longe, respirou fundo e foi na direção deles. Parando a poucos metros pôs-se a olhá-los, amavelmente. Os filhos sem entender o que estava acontecendo ficaram em silêncio. Então, um silencio ensurdecedor tomou conta do ambiente. Todos se olhavam sem saber o que fazer.
Pela primeira vez na vida, os filhos viram seu pai chorar.
Nesse momento descobriam o que tinham que fazer. Lentamente se aproximaram do pai e o abraçaram ternamente.
- Eu amo vocês! – disse o pai.
Também ouviram o pai dizer, pela primeira vez, algo que sabiam desde o começo de suas existências, mas que nunca o ouviram dizer. Naquele momento, abraçados, emocionados, se uniram todos, formando um só corpo. Formando uma só família.
Uma verdadeira família.


Marc Souza

Um comentário:

  1. Nunca é tarde. Mesmo assim, o amor jamais deve ser deixado por último. Bom dia! Lindo e tocante, o teu texto, Marc.

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