Em uma sala, de um certo presidente
de um certo partido político.
- Senhor, nós não podemos votar a
favor deste projeto de Lei, afinal, isso vai contra tudo que o nosso partido e,
principalmente, nossos eleitores, acredita.
- Não me venha com esta estória,
afinal, tudo muda, as idéias mudam, o mundo muda, portanto, mudamos.
- Mas senhor, e os nossos eleitores?
- Isso é o que menos importa, ou
você acha que eles sequer se lembram o que defendemos e o que fomos contra na
época da eleição.
-
E nós. Nós nos lembramos, ou não?
- Só lembre-se de uma coisa, certo,
nunca se esqueça do que vou dizer agora. É só política, e em política, quem se
importa com o que os eleitores vão falar, afinal, eles logo se esquecerão, e
votarão em nós novamente. A memória do povo é curta. Temos que pensar no bem do
nosso partido. Esse projeto de Lei vai trazer muitos benefícios a nós.
- Mas, e o povo, a opinião pública é
totalmente contra, sem falar que este projeto beneficiará uma parcela ínfima da
sociedade.
- A parcela que financia nossas
campanhas, não é verdade? Isso é o que importa, o partido, a próxima campanha
que está chegando.
- E o povo? O povo que nos elegeu,
que acreditou em nós, em nossos projetos.
- Não esquenta com isso, o povo,
nada mais é do que o mal necessário, meia dúzia de palavras bonitas, uma doação
de remédios aqui, outra ali, um passe para viagem acolá, algumas cestas
básicas, e, você sabe né, votos e mais votos. Com os nossos financiadores a
coisa já é mais difícil, eles querem resultados e benefícios e é por isso que
nos ajudam, que nos financiam, isso é o que importa, nunca se esqueça disso,
sem eles não estaríamos aqui, os votos que tivemos do povo, foi reflexo do que
demos para o povo na época de eleição, com o dinheiro dos nossos contribuintes,
dos nossos amigos geradores de renda, então, você já sabe, melhor o povo ficar
contra nós, o que passará rápido, do que eles, que com certeza não se
esquecerão e não serão mais nossos colaboradores.
- Então? O que o Senhor achou? Belíssimo
projeto, não? Estou muito empolgado com este projeto, afinal, ele é perfeito.
Note que, através dele poderemos erradicar a pobreza no país, sem contar que,
com ele poderemos avançar de forma impressionante em todas as áreas produtivas
do país, e, principalmente na área social. Sem dúvida alguma é o melhor projeto
que nosso país jamais viu. É um marco na nossa política.
- Calma muita calma meu filho. Sem
dúvida este projeto é muito bom, não há dúvidas do bem que o mesmo possa causar
ao nosso país, no entanto, ainda é muito cedo para qualquer comemoração. Ainda
é cedo para nos empolgarmos, afinal, essa papelada toda não passa de um
“projeto”, não é mesmo? Talvez nem seja aprovado.
- Como assim? Como talvez não seja
aprovado? Ele é perfeito! O único defeito dele, que na verdade não é um
defeito, e sim uma pontinha de inveja de minha parte, é que, este projeto não
foi elaborado pelo nosso partido.
- Então, é aí que eu queria chegar,
o fato deste projeto não ter sido elaborado por nós é o maior empecilho para
que possamos aprova-lo.
- Como assim? Não entendo o que o
senhor esta querendo dizer?
- Meu filho! Pense bem! O projeto
não é só bom, é ótimo.
- Então?
- Entenda uma coisa, garoto, se este
projeto for aprovado, pode ser o nosso fim. O partido que o elaborou, vai, com
certeza, ficar em evidência, e isso é muito ruim para nós. Com o partido em
evidência, eles terão muita força nas próximas eleições, podendo eleger até um
presidente, e isso com certeza não é nada bom para nós. Não é mesmo? Eles poderão
ter todo o poder para governar o nosso país, por isso...
- Por isso?
- Por isso seremos totalmente
contrários a aprovação deste projeto. Faremos lobby para que o mesmo nem vá ao
congresso para ser votado.
- Mas por quê?
- Pense bem, você não esta contente
com toda essa mordomia que tem financiada pelo dinheiro público, com esse belo
salário, e, o principal tudo isso em troca de, somente, três dias de trabalho.
E não estou contando com as gordas comissões que recebemos por baixo do pano.
Pense nisso. Você esta contente ou não?
- Claro que estou contente, mas não
podemos...
- Então, temos que ser contra esse
projeto, temos que trabalhar incansavelmente para que ele não seja aprovado,
temos que usar toda a nossa influência, senão, babal, adeus mordomias, adeus
dinheiro fácil, adeus reeleição, fim, acabou a moleza. Não temos tempo a
perder, portanto, trate de começar a trabalhar contra esse projeto.
- Mas, isso seria uma traição ao
povo que nos elegeu, que espera ansiosamente que solucionemos seus problemas,
que necessita urgentemente de uma solução aos seus problemas, que nesse momento
podem estar morrendo de fome de sede ou de qualquer tipo de doença, que não
conseguem tratar por negligência médica. Para esse povo que merece uma vida
melhor. Isso seria uma traição ao nosso país, ao nosso povo.
- Dane-se o povo, prefiro trair o
povo, do que o meu bolso, antes eles passarem dificuldades do que eu, não é
mesmo. Você é muito novo, então, vou lhe dar um conselho, quer fazer o bem a
alguém vá trabalhar voluntariamente em alguma ONG. Somos
político, filho, não assistentes sociais.
- Filho de uma mãe. Não acredito que
ele fez isso. Desviando tanto dinheiro assim, é lógico que estaria podre de
rico, não é verdade? Agora essa CPI vai acabar com ele, acabar com a carreira
dela. Ele bem que merece isso. Filho de
uma puta, e pensar que eu subi em palanque com ele. Ainda bem que a memória do
povo é curta, senão, eu também tava ferrado.
- É por essas, e outras situações
que temos, que começar a trabalhar, urgentemente, afinal não temos tempo a
perder, devemos convocar os partidários agora, todos, sem exceção, não podemos
deixar que esta CPI aconteça.
- O que? Como assim? O cara é um
bandido, roubou milhões dos cofres públicos.
- Opa, opa. Calma aí.
- Calma aí, por quê? As provas são
claras não há dúvidas de que o filho da mãe desviou milhões de reais para si. È
questão de justiça que ele pague pelo crime que cometeu.
- Justiça. Que justiça que nada.
Coloque uma coisa na sua cabeça, não há justiça, aqui a justiça não existe. Não
se esqueça de uma coisa garoto, o mundo não é justo, a vida não é justa. Nunca
foi, nem nunca vai ser. Você sabe o que é Utopia, é esse papo de justiça. Aqui,
nós fazemos política. E é o que começaremos a fazer agora mesmo.
- Como assim?
- Ele é um grande aliado nosso,
sempre, foi, agora precisa da gente, e vamos ajudá-lo. Afinal, com certeza,
livrando-o dessas acusações e dessa CPI, receberemos muitas benesses, se é que
você me entende.
- Mas...
- Não venha com esse discurso, não
temos tempo a perder, temos uma CPI a evitar.
- Não acredito, o cara roubou
dinheiro público, dinheiro que ajudaria, e muito, as classes mais carentes do
nosso país, temos, como representantes eleitos pelo povo, o dever de defender
este dinheiro, que é deles por direito, não de proteger este vagabundo...
- Temos, é a obrigação de
defendermos e ajudarmos os nossos amigos e aliados. Dane-se de onde vem e
para aonde ia o dinheiro, se ele não
roubasse, outra pessoa roubaria, e poderia ser pior, algum inimigo político
nosso, aí sim a coisa ficaria feia, como poderíamos tirar proveito desta
situação, heim, se outra pessoa é que tivesse tido a idéia de desviar aquele
dinheiro. O que temos que fazer agora, é, urgentemente, barrar esta CPI, e
aproveitarmos a situação para tirar proveito de tudo o que esta acontecendo,
principalmente, financeiramente, entendeu, esta é uma ótima oportunidade para
tirarmos vantagens, gordas vantagens, entendeu.
- Não acredito que vamos fazer isso.
- Pode acreditar, afinal, temos que
pensar no futuro, o povo é besta, idiota mesmo, não vão se lembrar de que
trabalhamos contra esta CPI, e se lembrarem, e por um acaso, não formos
eleitos, esta situação nos trará um grande pé de meia, o suficiente para
ficarmos quatro anos de férias, e voltarmos com a corda toda quando ninguém
mais se lembrar do caso, portanto, vamos trabalhar.
Marc Souza
Isso acontece todos os dias... Somos ludibriados, enganados... Ótimo texto, parabéns!
ResponderExcluir